quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Estação Partizanskaya, uma história para jamais esquecer



Visitar o metrô de Moscou não é apenas usar um meio de transporte, é antes de tudo visitar um museu subterrâneo que conta importantes momentos sobre a história de uma civilização moderna, a civilização soviética.

No começo do século XX surgiram as primeiras propostas para a construção de um metrô no Império Russo. Essa proposta era vista com desdém pela nobreza, misturar nobres aristocratas e populares camponeses, operários? Nem pensar! Isso mudou com os bolcheviques, inspirados nos eventos das ruas de 1905, que levou à Praça da Revolução de 1917, assim, inspirados nesses eventos surgiram as Estações "Ulitsa 1905" e "Praça da Revolução". Mas há uma estação que conta um momento muito delicado, uma história especial. Lá, quando o passageiro desce no metrô ele vê um monumento imponente, onde um camponês, barbado, com seu shapka e sua lendária submetralhadora PPSh-41, ergue imponente o braço direito, fazendo sinal de "alto", impossível não parar e contemplar o monumento. Logo ao lado do vovô está um jovem em trajes civis, com um fuzil Moisin-Nagant e uma camponesa com uma submetralhadora PPSh-41. Um desavisado poderia pensar se tratar de "militares", todavia não se trata de militares, eles são os "partizans", o exército invisível, clandestino, irregular, da guerra de guerrilhas. Eram em geral civis, camponeses que pegavam em armas contra o fascismo, em alguns casos militares separados de suas unidades ou fugitivos de campos de concentração nazista, em outros casos eram jovens do partido comunista lançados atrás das linhas inimigas para operações clandestinas.

Na Estação Partizanskaya (isto é, Estação dos Guerrilheiros) estão dois grandes monumentos desconhecidos por muitos, mas conhecidos por aqueles que verdadeiramente amam a Rússia e o seu povo. Eles estão sempre adornados de flores, permanecem na memória eterna dos justos, dos comunistas, dos patriotas, dos verdadeiros cristãos que compreendem o verdadeiro significado da palavra "abnegação". Um dos monumentos retrata Matvey Kuzmin, o cidadão mais velho a receber o título de "Herói da União Soviética", cujo feito era equiparado ao de Ivan Susanin. Matvey era um camponês autônomo, não fazia parte de um Kol'hoz, ele viu o país onde semeou, em que trabalhou ser invadido pelas hordas genocidas "civilizatórias" do III Reich, que naqueles tempos encontravam-se a caminho de Moscou. Fazendo-se passar por um amigo, o comandante alemão ofereceu a Matvey, de 83 anos, tudo o que ele precisava para ser um camponês rico e próspero - dinheiro, querosene, farinha e mesmo um rifle de caça. Matvey disse conhecer um atalho para se chegar até a vila de Malkino, tratando assim de guiar os nazistas. Ocorre que Matvey alertou ao seu neto sobre seu plano, enviando o garoto para a vila de Pershino, onde estavam estacionadas tropas do Exército Vermelho. 

Levando os alemães por caminhos duvidosos, Matvey guiou-os até os subúrbios de Malkino, onde o batalhão alemão foi atacado de surpresa pelas tropas do Exército Vermelho e da Milícia Popular, sofrendo pesadas perdas, mais de 50 homens, tendo 20 capturados, e sendo os alemães obrigados a fugir. Durante o tiroteio, o oficial alemão, percebendo do que se tratava, enfureceu-se e a tiros de pistola executou o ancião camponês. Matvey foi enterrado com honras militares e sua história tornou-se conhecida por meio do jornalista do Pravda Boris Polevoy, que também escreveu um livro infantil chamado "O último dia de Matvey Kuzmin", que ainda faz parte do currículo escolar russo. Em 1943 foi incluído no metrô de Moscou, na Estação Partizan, um monumento ao herói ancião, feito pelo artista Matvey Manizer. Por decreto do Soviete Supremo, em 1965, Matvey foi condecorado post mortem com o título de Herói da União Soviética, o maior do país.


Todavia os exemplos de heroísmo e galhardia não se limitam aos anciãos na Estação Partizanskaya, mas também aos jovens. Ao atravessar os trilhos da parte central do metrô por meio de uma escadaria, temos acesso a um monumento que se ergue imponente, de uma jovem de cabelo curto, com um olhar altivo, botas, saia, e um fuzil nas costas, uma jovem por vezes comparada a Joana D'Arc. É o monumento a Zoya Kosmodemyanskaya.

Zoya Kosmodemyanskaya era uma jovem comunista, "komsomol", era bastante determinada e destemida, conhecida pela sua personalidade independente desde a época da escola. Quando a guerra começou, apesar da proibição de seus pais (ela tinha apenas 18 anos), Zoya alistou-se como voluntária para a guerra de guerrilhas, para se tornar uma "partizanka". Tornar-se uma partizanka era uma atividade que, em especial para uma mulher, ainda mais uma garotinha de apenas 18 anos, exigia grande coragem. Exigia coragem para, por exemplo, saltar de paraquedas, uma modalidade nova da arte da guerra naqueles tempos, saltar de enormes altitudes sem se ter a certeza de se chegar até o chão inteiro. Também exigia preparo físico, que Zoya e muitos outros jovens soviéticos possuía, bem como a capacidade de, sob qualquer circunstâncias jamais entregar os companheiros.

Enviada para trás das linhas inimigas, operando a partir de território ocupado pelos nazistas, Zoya e seus companheiros disfarçados de camponeses tinham como missão plantar minas terrestres para destruir veículos do invasor e incendiar casas para que os alemães não tivessem onde passar a noite sob o frio. Numa dessas missões, um dos companheiros de Zoya foi capturado, entregando a guerrilheira russa. Enquanto tentava incendiar um estábulo da cavalaria alemã na vila de Petrischevo, Zoya foi surpreendida por soldados alemães, sendo capturada. Assim como Cosme e Damião, santos torturados pela água e pelo fogo (Kosmodemyanskaya significa em russo "De Cosme e Damião"), Zoya foi torturada de todas as formas para entregar os seus companheiros, nunca revelando a posição da sua guerrilha nem se submetendo aos alemães, foi exposta ao fogo de vela, e levada nua para o a neve congelante.


Após os esforços inúteis, os alemães decidiram enforcar Zoya em frente aos camponeses. Ela foi obrigada a carregar uma placa "Sou incendiária de cabanas". Desafiadora até o último instante, antes da forca Zoya declarou: "Vocês podem até me enforcar, mas atrás de mim estão 200 milhões parar vir atrás de vocês". Enforcadas pelos nazistas, Zoya foi retirada da forca com seus últimos suspiros de vida, quando então os nazistas, sorrindo, desferiram golpes de machado contra o corpo moribundo de Zoya Kosmodemyanskaya, esquartejando-a, deixando o seu cadáver exposto na neve, ato cruel e bárbaro fotografado e documentado pelos próprios alemães, que por vezes tinham como "hobby" enviar tais fotos para seus amigos e familiares. Segundo a companheira de Zoya, Klavdiya Miloradova, o cadáver de Zoya sequer tinha mais unhas.

O traidor de Zoya, Sergey Sviridov, pôde fugir, ele chegou a ganhar dos alemães como "recompensa" um copo de vodka, relatando arrependido a sua traição às autoridades soviéticas, que processaram-no, julgaram-no e fuzilaram-no por traição. A história correu o país, pelo heroísmo da jovem e pela barbaridade dos fascistas, em breve viria a represália soviética. Chegando a história ao conhecimento do Secretário do Partido Comunista e agora elevado ao posto de Marechal da União Soviética, Iósif Vissaryonovich Stalin, este emitiu pela primeira vez a ordem para que durante o ataque à unidade alemã identificada pela inteligência soviética, 332º Regimento de Infantaria do Wermacht, "não fossem feitos prisioneiros", isto é, para que os militares do exército vermelho atirassem inclusive em quem se rendesse. Dito e feito. Um dos últimos soldados perseguidos pelo Exército Vermelho era um sargento nazista, cuja bolsa continha fotos do cadáver esquartejado e da execução de Zoya Kosmodemyanskaya. Assim, a martirizada jovem russa tornou-se a primeira mulher a receber o título de "Herói da União Soviética" durante a grande guerra. A Igreja Ortodoxa Russa estuda uma proposta para a santificação de Zoya Kosmodemyanskaya, lembrada na Estação Partizanskaya. No ano 2014, o Patriarca de Moscou e Toda a Rússia, Cirilo, exortou os jovens russos a seguir o exemplo do Marechal Júkov e de Zoya Kosmodemyanskaya.


O autor do blog, depositando flores no monumento a Zoya Kosmodemyanskaya

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